sábado, 22 de março de 2014

Débora, juíza e profetiza.




Embora a história bíblica do Êxodo, a saída do povo judeu das terras egípcias, seja considerada inverossímil por muitos historiadores, existem provas arqueológicas de que a terra dos cananeus foi tomada pelos Israelitas por volta do XII século AEC.

Dessa tomada resultaram longos períodos de guerras e batalhas entre os israelitas e os povos de Canaã. O livro que relata esses conflitos é o Shoftim, nome hebraico do Livro dos Juízes do Velho Testamento. Nele encontra-se também a história da juíza Débora, figura marcante das Sagradas Escrituras. Os relatos bíblicos são cheios de personagens interessantes, mas raramente destaca-se alguma mulher, estas geralmente aparecem apenas como esposas dos patriarcas. Débora se apresenta de forma singular e única por ter liderado corajosamente, uma revolta contra um rei iníquo.

Os dados sobre ela são escassos, sabe-se que vinha da tribo de Efraim e era esposa de Lapidote, mas não se diz quando ganhou preeminência e tornou-se juíza entre os Israelitas.
O período dos juízes se deu antes de se estabelecer a monarquia em Israel. Quando os judeus saíram do Egito, sob a liderança de Moisés, este tomou sobre si a responsabilidade de orientar o povo em todos os assuntos. As tribos dirigiam-se a ele  levando suas questões e dificuldades, na esperança de encontrar soluções. Mas o número de inquiridores era incalculável e Moisés foi aconselhado por seu sogro a eleger pessoas capazes para julgar Israel junto a ele (ler o post Jetro), o que veio a tornar-se uma tradição. 

Quando os Israelitas chegaram em Canaã continuaram sob a liderança de outros juízes. Além dos juízes haviam também os profetas e os Sacerdotes, sendo estes últimos os principais na hierarquia. No caso de Débora, diz-se que era juíza e também profeta. O texto sagrado relata que ela sentava-se embaixo das palmeiras entre Ramá e Betel, e para ali o povo se dirigia em busca de conselho.

Nos dias de Débora muitos israelitas vinham sofrendo opressão sob as mãos do tirânico Jabim, rei de Hazor. A profetiza foi incumbida por Deus da tarefa de defender o povo. Ela deveria chamar a Barac, um comandante militar da tribo de Naftali, para liderar um exército contra Sísara, capitão das tropas de Jabim.

O historiador judeu Flavio Josefo, narra a batalha em sua História dos Hebreus:
Débora, depois desse oráculo (a tarefa que recebeu de Deus), ordenou a Baraque (Barac) que reunisse dez mil homens e atacasse os inimigos, sendo suficiente esse pequeno número, pois Deus prometia-lhes a vitória. Baraque respondeu-lhe que não podia aceitar o cargo se ela não tomasse, com ele, o comando do exército. Ela, porém, respondeu-lhe encolerizada: “Não tendes vergonha de ceder a uma mulher a honra que Deus se digna fazer-vos? Eu, porém, não recuso recebê-la”. Reuniram assim dez mil homens e foram acampar no monte Tabor. Sísera (Sísara), por ordem do rei seu senhor, marchou para combatê-los e acampou próximo deles.


Baraque e o resto dos israelitas, espantados com a multidão dos inimigos, intentaram retirar-se e afastar-se quanto possível. Mas Débora os deteve e ordenou-lhes que combatessem naquele mesmo dia sem temer aquele grande exército, porque a vitória dependia de Deus, e deviam confiar no seu auxílio.

Travou-se o combate. Nesse momento, viu-se cair uma forte chuva com granizo. O vento impelia-a com tanta violência contra o rosto dos cananeus que os arqueiros e fundibulários não se podiam servir nem dos arcos nem das fundas, e os que estavam armados mais pesadamente tampouco podiam usar as suas espadas, tão enregelados estavam pelo frio. Os israelitas, ao contrário, tendo a tempestade pelas costas, não eram incomodados por ela e ainda sentiam redobrada a coragem, vendo nela um sinal visível do auxílio divino.

Assim, eles venceram e mataram um grande número de inimigos, restando apenas um pequeno número, que pereceu sob as patas dos cavalos e as rodas dos carros de seu próprio exército, o qual fugia em desordem.”

Barac aparece como um grande comandante diante das forças de Jabim, derrotando completamente o exército inimigo. Mas o texto bíblico e também Josefo destacam sua falta de fé e coragem, pois recusou batalhar sem a companhia de Débora, em vista disso a juíza disse “Certamente, irei contigo, porém não será tua a honra da investida que empreendes; pois às mãos de uma mulher o Senhor entregará a Sísera.”. Barac, apesar do sucesso de sua campanha, não foi capaz de alcançar Sísara. Este abandonou seu carro de batalha e fugiu a pé até as terras de Héber, uma parente distante de Moisés, que tinha tomado partido de Jabim. Lá esperava encontrar refúgio mas foi recebido por Jael, esposa de Héber. A princípio ela o acolheu bem, tendo sede, deu-lhe coalhada e depois deixou-o dormir em sua tenda pois estava exausto. Enquanto dormia, Jael se muniu de uma estaca e martelo e chegando-se a ele, fincou-lhe a estaca na testa até atravessar o crânio, matando Sísara instantaneamente.

Não existe nenhum registro que explique ou revele uma ligação entre Jael e Barac, nem mesmo à Débora. O mais provável é que Jael, embora casada com Héber, fosse leal ao povo hebreu e viu em suas mãos a chance de prestar grande auxílio a seus compatriotas.

Cumprira-se assim a profecia de Débora, de que Sísara seria entregue nas mãos de uma mulher. Nesse episódio da história do povo hebreu, Débora e Jael aparecem como grandes heroínas.

Josefo nos diz que após a morte de Sísara, Barac continuou a avançar em direção a Jabim, sendo esse derrotado após grande batalha.

A guerra dos Israelitas, sob comando de Débora e Barac, contra Jabim pode ser lida nos capítulos 4 e 5 de Juízes, sendo o primeiro capítulo em forma de prosa e o segundo na forma de um cântico que ficou conhecido como Cântico de Débora, nele a juíza é alçada ao status de “mãe” da nação. Este cântico é um dos exemplos mais antigos de poesia hebraica.

A Bíblia não fala nada sobre a vida de Débora após a batalha contra Sísara. Josefo diz que Barac governou Israel, após destronar Jabim, por mais quarenta anos, e acrescenta que Débora morreu quase na mesma época que Barac. É possível então que Débora tenha vivido ainda durante muitos anos, e que tenha continuado com sua tarefa de aconselhar e fazer juízo sobre o povo.

Fonte: Aqui.